Rio de Janeiro - sua voz

Um acontecimento ocorreu no show do Seu Jorge no Rio

BrunoricO (Rio de Janeiro) - 1 de novembre 2012
Este texto (leia desabafo) é uma crônica sobre um acontecimento que ocorreu no show do Seu Jorge, neste sábado (27/10/2012). E o que aconteceu definitivamente precisava e precisa ser relatado de uma forma bem abrangente, as palavras clamam por liberdade dentro de mim; é a agonia do escritor que só.

Não, não! O texto não é sobre a nova novela da Rede Globo.

Não, não! O texto também não é sobre o santo guerreiro da Capadócia.

Para que o nobre leitor se ambiente com o que será relatado, primeiramente é preciso dizer que o show ocorreu na Fundição Progresso, uma conceituada casa de shows da Lapa, Rio de Janeiro; e por volta de 01h00min da madrugada de domingo, o grande DJ CIA se posicionou na sua pickup, que ficava no centro do palco, e começou a discotecagem para animar o público.

Como sempre o CIA foi impecável, tocou alguns clássicos da black music mundial, e deixou a plateia no ponto para receber a grande atração da noite: Seu Jorge.

Depois de 15 minutos de DJ CIA, Seu Jorge entrou no palco, o próprio CIA também continuou onde estava, e o show seguiu.

Tudo estava indo muito bem, Seu Jorge dançava e cantava como se fosse o seu primeiro show, e todos estavam curtindo.

A alegria do artista era compreensível, ele que é um cantor que viaja muito pelo mundo, estava fazendo um show no seu país e na sua cidade, ou seja, estava em casa.

E por incrível que pareça, praticamente no meio do show, a própria casa, ou parte dela, o apunhalou.

Agora que começa verdadeiramente o texto, agora é que virá o assunto que dividiu o show em duas partes.

E eu vou confessar: to puto até agora.

Pra quem não sabe - e pelo visto muita gente que estava presente no show não sabia – a apresentação do Seu Jorge tem alguns momentos temáticos, ou seja, em determinado momento ele canta uma sequencia mais romântica, em outra mais dançante, e temos também uma sequencia politizada/protesto, com a música “zé do caroço”, seguida da declamação de “negro drama”, dos Racionais mc’s.

Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que Seu Jorge tem muita autonomia para declamar “negro drama” em um palco, pois um cara que morou na rua, passou fome, sofreu preconceito, e hoje é o que é mundialmente, tanto quanto músico, como ator, tem SIM muita propriedade para se intitular um negro drama, afinal de contas... Dinheiro, problemas, inveja, luxo, fama.

Enquanto Seu Jorge declamava com muita paixão os versos de “negro drama”, parte da plateia começou a vaiar, pois é, vaiar! Antes de continuar eu só gostaria de fazer um questionamento: o que leva uma pessoa a pagar R$60,00 no show de um artista, e posteriormente vaiá-lo? Pois esse foi o meu questionamento imediato na hora, depois vieram muitos outros, mas enfim...

As vaias não intimidaram Seu Jorge, que prosseguiu firme como o seu homônimo santo da Capadócia.

Quando a declamação chegou na parte do Brown, as vaias já eram bem mais expressivas, alguns até vociferavam um coro de: “canta, canta, canta!” Dando a entender que todo aquele recital negro já estava ferindo os tímpanos de alguns acéfalos – racistas talvez – que só queriam cantar e dançar, apenas isso. Talvez uma declamação de “branco drama” soasse melhor naquele momento, talvez não houvesse a vaia, talvez. Mas como não existe tal poesia, eu só posso ficar no talvez.

Eu estava no show com a minha companheira, meu compadre e minha comadre, e todos nós ficamos profundamente chateados e estarrecidos com o que estava acontecendo, afinal de contas, aquelas vaiais ecoavam vários significados: preconceito, ignorância, intolerância, alienação e etecetera e tal. E isso tudo em pleno 2012. E tem gente que ainda acha que o ser humano evoluiu alguma coisa.

Após declamar “negro drama” por completo, as luzes do palco se apagaram, Seu Jorge se calou por alguns instantes, e ao acender das luzes o artista já estava visivelmente abatido, porém não se curvou, e discursou palavras parecidas com estas:

- “Quando eu toco na França eles falam muito bem do Brasil"" lá eles falam que se você for branco, bonito e tiver uma faculdade, o Brasil é o lugar para ir. Portanto, vocês que são brancos, bonitos, possuem uma faculdade e o papai dá tudo, aproveitem, pois tem alguém de olho no emprego de vocês.”

Em meio a aplausos e vaias ele continuou...

- “Essa música ‘negro drama’ tem muito significado pra mim, e nos meus shows ela vem seguida de ‘zé do caroço’. Vivemos em um país onde a maioria das pessoas luta pra caramba e permanece na miséria, um país onde a classe trabalhadora não é respeitada, e tudo isso tem que ser dito”.

E teve mais (dá-lhe Jorge!)...

- “Joaquim Barbosa lavava o chão do lugar onde hoje ele é ministro chefe, um cara negro, que nasceu pobre, estudou em escola pública, e hoje é o que é, hoje fez o que fez, o cara bateu na cabeça dos políticos, condenou muita gente, mesmo que não dê em nada ele fez o seu papel, condenou, em um país onde não se condena político ele foi lá e fez, tinha que ser um negão pra fazer um bagulho desses.”

Seu Jorge falou mais algumas coisas que não me lembro, até porque minha mente estava em profunda ebulição, era muita informação e emoção para um momento só.

Bom, depois de tudo isso, depois de todo esse desabafo do artista, eu nem preciso dizer que o clima da casa mudou totalmente, e como eu escrevi antes, o show ficou dividido em duas partes: antes de “negro drama” / depois de “negro drama”. Que simbologia poética isso, hein.

Logo depois desse marcante fato, Seu Jorge generosamente chamou uma convidada no seu palco, e fez questão de dizer que ela cantava uma onda diferente da dele, mas que era para todos ouvirem, pois a cantora era de qualidade, e de fato era – se bem que no Brasil isso não tem grande valia.

A cantora era de São Paulo, se chamava Cris Oak, e cantou Jazz. E quando eu pensei que os ânimos iriam ficar mais amenos, eis que no meio da música da convidada, as vaias voltaram, e a ignorância cultural do público aflorou outra vez. Talvez se o convidado fosse um Michel Teló...com seus hits dançantes, as coisas fossem diferentes, mas como era um Jazz, e pouca gente sabe apreciar isso, ainda mais no Brasil, a cantora foi obrigada a ouvir algumas vaiais também. Certamente essas vaiais ainda faziam parte da insatisfação dos ouvintes que ficaram profundamente ofendidos com a declamação de “negro drama”.

Depois de tudo isso, Seu Jorge voltou a “cantar”- e eu coloquei com aspas, pois o artista não foi mais o mesmo, e nem deveria ser!

Seu Jorge passou a “cantar” com total descompromisso, não dançava mais, e geralmente ficava parado em algum canto, com um braço cruzado nas costas, enquanto o outro segurava o microfone, tudo isso nitidamente sem ânimo algum.

Logicamente que ninguém é obrigado a gostar de nada, mas as pessoas precisam aprender a ter respeito, e foi isso que faltou no show. Muita gente certamente não gostou da declamação de “negro drama”, tudo bem, é um direito, mas chegar ao ponto de vaiar soa muito radical e preconceituoso sim! Até porque depois disso ele fez um discurso bem fundo nos problemas do Brasil, tanto em questões raciais, quanto sociais, e aquilo pareceu ter ferido ainda mais os tímpanos de alguns, pois como diz na própria música que causou toda a discórdia: “periferias, vielas e cortiços, você deve tá pensando, o que você tem a ver com isso”.

E enquanto a sociedade brasileira achar que não tem nada a ver com o problema do menos favorecido, as coisas nunca irão progredir de fato, pois a história do Brasil nos mostra isso. E certamente esse foi o pensamento de muitos no show.

Os sentimentos preconceituosos estavam tão evidenciados, que eu consegui ler as mentes. Sabe aquela nuvenzinha branca das animações que relatam os pensamentos? Pois então, elas estavam visíveis para mim, a maioria tinha o seguinte texto: “porra, que é que esse negão tá falando aí no palco, eu quero ouvir música, quero entretenimento, foda-se o problema do preto, do pobre, eu quero dançar”.

E com estes pensamentos retrógrados, todos nós seguimos dançando a mesma música: a da ignorância. Ignorância que cega e individualiza os seres cercados em seus condomínios. Ignorância que vaia o artista que discursa sobre os problemas de um país, dando a entender que todos nós vivemos as mil maravilhas. A ignorância sempre foi, e sempre será um dos maiores problemas do brasileiro, e engana-se quem pensa que ignorância tem a ver com pobreza ou grau de instrução, tem muita gente com a conta bancária lotada de cifras, com diploma não sei da onde, que é totalmente ignorante em diversos aspectos.

Como diria uma boa cozinheira: “o bolo desandou”. Essa foi a frase que passou a definir o show do Seu Jorge depois de declamar “negro drama”.

Confesso que depois desse show eu fiquei muito mais fã do artista e da pessoa Jorge Mário da Silva. E também consegui ficar muito mais descrente com a população do meu país, pois a mesma mergulha em uma falta de cultura profunda, eu tenho até medo de ver onde isso vai parar. As pessoas não sabem mais o que ouvem, não sabem mais a origem de nada, querem tudo mastigado, não pesquisam nada, não respeitam nada, não questionam nada, e lutam apenas por um bem individual, e nunca coletivo; esse é o perfil do cidadão brasileiro padrão, um cidadão omisso, que não conhece a sua real cultura. Um cidadão hipócrita, que tem coragem de fazer passeata durante o dia, vestido de branco, enquanto a noite, ele briga na rua após tomar uma simples fechada no trânsito.

É preciso repensar o nível de imbecilidade, intolerância e ignorância que o nosso povo chegou, não sei se isso tem volta ou remédio, o meu pessimismo diz que dias piores virão.

Enquanto isso, só me resta relatar o cotidiano, poetizar as revoltas e os sentimentos de um mundo cada vez mais sem sentimento, que é habitado por seres que não aprenderam a apreciar uma verdadeira arte.

Só me resta terminar esta crônica com uma frase dita pelo próprio Seu Jorge, em meio a todo tumulto: “Viva a alienação carioca!” Embora eu saiba que este mal possui esferas que vão muito além de terras cariocas, infelizmente.

Ah, só pra constar: histórias, registros, escritos, não é conto nem fábula, lenda ou mito.




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